quinta-feira, 11 de outubro de 2012

santo dia santo

todos os dias ele tinha o mesmo ritual. após levantar-se da cama e espreguiçar-se, escovava seus dentes rapidamente, dava um beijo seco na testa de Raquel, bebia um café expresso que ele mesmo gostava de preparar com suas veneradas gotículas de adoçante. lia brevemente as notícias no jornal enquanto as ouvia simultaneamente na televisão. mergulhava seu biscoito no café. sim, mania de gente de idade, sabe? comia. escovava seus dentes novamente e pouco antes de pegar sua maleta e sair, afagava a cabeça de Thor, o cão. era mais uma típica manhã de todo-santo-dia, mas não era. não fora. ao sair pela porta, o fez pela última vez. nunca mais afagou seu melhor amigo, nunca mais beijou sua filha com amor, nunca mais mergulhou seu biscoito e viu-o desmanchar, nunca mais leu notícias e chorou com elas. nunca mais compraram adoçante naquela casa. tampouco o açúcar teve gosto doce.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

não sei achar explicações, tampouco sei configurar em minha mente tal vazio. nessa inconstância corriqueira do adeus, você vai mas eu... eu fico. pra ver, quem sabe, alguma diferença que te traga de volta. se em minhas fraquezas de outrora falhei ou pequei contra minha própria fé, me conte antes de sair por ali, pela última vez. e depois? ora, depois vai conquistar o mundo. vai dar amor aos corações que já não sonham mais.

sábado, 21 de janeiro de 2012

teu reflexo

Ela refletiu, como que num espelho d'água criado pelo seu espírito e eu fiquei boquiaberto como constantemente ocorre quando a vejo. Sabe aquelas fotos de cores contrastadas, na beira do mar no por-do-sol que te fazem pensar que você também queria ter um momento desses só seu e daquele alguém. Poisé, ele está lá. Me refiro ao momento. Todos os dias, camuflado pela tua perda do olhar. Tudo é constância e você não foi ensinada a lidar com isso. Nunca precisou. Mas hoje, ah, está tudo tão diferente. Você precisa do velho brilho, daquela sensação gostosa e inexplicável, e entende que isso tudo nunca te abandonou. Os velhos objetos, as mesmas pessoas, por que não as roupas tão usadas, o corte de cabelo comum, os prédios cinzas e os cachorros das ruas? Por que minha cara, isso só parece bonito na vida dos outros? Nas fotos contrastadas dos outros? No meu caso, tenho meu resgate desse umbral humano, o reflexo dela na poça d'água. Eu atiro outra pedra e ela sorri. E o mesmo sorriso de sempre me faz sentir assim por uma vida ou duas.